quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Benzedeiras resistem em Franca, mas não têm sucessoras em casa




“Isipela maldita, a carne que tu come, a Deus não lograrás, um Padre Nosso, uma Ave Maria, uma Santa Maria vou te curar.” “Procurei São Elias, o que é que cura cobreiro e cobraria? Ramo de funcho e água fria.” “Arruda, corre, corre cavalinho, passa na porta de Santa Luzia, e diga para ela dar uma benção para o meu olho.” Essas rezas, para “isipela” (uma infecção cutânea, cujo nome verdadeiro é erisipela), cobreiro (uma doença de pele) e ar (ardência nos olhos), respectivamente, podem muito em breve se tornarem apenas uma lembrança do passado. Elas são usadas pelas benzedeiras, que se dizem instrumentos de Deus, curam por meio de plantas e orações, e encontram atualmente muita dificuldade para difundir seus conhecimentos.


O Comércio da Franca localizou quatro benzedeiras em Franca, e todas elas afirmam que a tendência é que, em alguns anos, a prática acabe porque as novas gerações não querem aprender o “ofício”. A aposentada Ivone Coelho Senni, 83, benze desde que tinha 22 anos. Ela aprendeu a prática com a sua mãe, mas não tem para quem passar os seus conhecimentos. “A minha filha queria aprender a benzer, mas desistiu dois meses depois. E nunca veio ninguém em casa para aprender.”

Já Zulma Maria de Souza, 77, também aposentada, contou que as pessoas atualmente até aceitam se benzer, mas têm vergonha de admitir o fato. A aposentada Silvéria Adelina, 78, e a pensionista Madalena José Dias, 94, dizem que ensinam as orações de benzeduras às pessoas que as procuram, mas acham que a fé da população diminuiu.

As quatro benzedeiras têm filhos, mas eles não querem seguir a “vocação” das mães por se ocuparem com seus trabalhos, por desinteresse e até por medo.

Se vem caindo gradativamente o número de benzedeiras, a quantidade de clientes continuam alta. Ivone diz receber de 10 a 15 por dia. Zulma afirma que há dias em que recebe até 28 pessoas.

As entrevistadas dizem que se tornaram benzedeiras através das mães. Ivone conta que, quando era menina, ficava perto de sua mãe e escutava como ela benzia. Apesar de ter começado a benzer apenas quando tinha por volta de 50 anos, Silvéria foi influenciada a se iniciar na prática pela mãe e sogra, ambas benzedeiras. As outras aprenderam com pessoas próximas. “Eu tinha mais ou menos 10 anos. Tinha uma vizinha que sabia benzer e me ensinou”, conta Zulma. Já Madalena entrou em contato com as rezas por meio de um benzedor idoso.

As benzedeiras dizem ser apenas instrumentos de Deus. Quem cura dos mais diversos males é Deus. “Quem é benzido precisa ter fé. Se não tiver fé, não resolve nada”, diz Ivone.

“Eu atendo pessoas com cobreiro, por exemplo, mas, se as pessoas estiverem contrariadas, com qualquer problema, eu posso fazer uma oração para elas”, conta Madalena. Outros males comuns tratados por elas são: vento virado (crianças que têm uma perna maior que a outra), cortar o medo de crianças que ainda não andam, espinhela caída (doença caracterizada por dores no estômago, costas e pernas), além dos tradicionais quebrantes e mau-olhado, que podem ser descritos como efeitos negativos.

Nenhuma das benzedeiras cobra por seus serviços. “Faço por amor, por caridade, com o coração limpo e aberto, sem receber um centavo. Eu dedico meu tempo ao amor e à caridade”, esclarece Zulma. “Fazer pelos meus irmãos é melhor do que fazer pra mim”, diz Silvéria.

Fonte: GCN

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